OPINIÃO
Inteligência Artificial como inventor: A decisão histórica da África do Sul e os impactos no mundo da PI
Nos últimos anos, a inteligência artificial tem avançado a um ritmo acelerado, transformando a maneira como interagimos com a tecnologia. Hoje em dia, a ideia de robots criarem novas invenções parece algo fora do comum, mas será que essa possibilidade está assim tão distante da realidade?
A ideia de estes poderem ser inventores pode levantar questões éticas e legais, para além de desafios tecnológicos que precisam ser superados. Entretanto, os avanços recentes no campo da inteligência artificial estão a tornar essa possibilidade cada vez mais real.
Existem diversos estudos e pesquisas sobre o desenvolvimento de algoritmos de inteligência artificial por robots, mas é importante ressaltar que a criação de algoritmos por robots ainda é uma área em desenvolvimento e pesquisa. Um estudo recente sobre esse tema foi publicado na revista científica "Nature Machine Intelligence" em 2021, onde investigadores da Universidade de Harvard desenvolveram um sistema de aprendizagem por reforço em que um robot aprendeu a criar o seu próprio algoritmo para realizar tarefas específicas.
O sistema permitiu que o robot avaliasse o desempenho de diferentes algoritmos e escolhesse o melhor para realizar a tarefa em questão e, inclusive, superou os algoritmos desenvolvidos por humanos para a mesma tarefa.
Outros estudos também têm explorado a possibilidade de robots desenvolverem os seus próprios algoritmos de inteligência artificial por meio do uso de técnicas de aprendizagem por reforço, algoritmos genéticos e outras abordagens. Esses estudos indicam que, no futuro, os robots poderão ter mais autonomia e capacidade de adaptação em ambientes complexos e imprevisíveis.
Houve lugar a recurso a algumas destas decisões, nomeadamente no European Patent Office (EPO), mas em sede de recurso o EPO manteve a rejeição do pedido de patente, argumentando que uma patente só pode ser concedida a um inventor que tenha “capacidade jurídica”.
O caso do sistema DABUS ("Device for the Autonomous Bootstrapping of Unified Sentience" ou Dispositivo para inicialização autónoma de consciência unificada) é um tipo diferente de inteligência artificial, uma máquina criativa, capaz de funcionar de forma independente. O seu criador, Stephen Thaler, defende que a Inteligência Artificial seria um “mecanismo de criatividade” capaz de gerar “ideias novas”. Inclusive, é dito que o próprio sistema do DABUS pode comparar as suas invenções num banco de dados pré-existente para avaliar quão inovadora é a sua arte.
Vários pedidos de patente foram submetidos em várias jurisdições indicando o próprio DABUS como inventor. Mas pode uma máquina ser considerada inventor?
Em tentativas recentes, as invenções deste algoritmo não conseguiram concessões de patentes na Europa, EUA ou no Reino Unido. Houve lugar a recurso a algumas destas decisões, nomeadamente no European Patent Office (EPO), mas em sede de recurso o EPO manteve a rejeição do pedido de patente, argumentando que uma patente só pode ser concedida a um inventor que tenha “capacidade jurídica”.
Já a África do Sul, numa decisão audaciosa, olhou para o sistema DABUS de modo diferente e reconheceu-o mesmo como um inventor.
Apesar das críticas, o instituto de patentes concedeu a patente figurando o DABUS como inventor (Stephen Thaler consta como requerente) argumentando que a decisão se deveu a um ambiente político direcionado para promover a inovação. Assim, a concessão de patentes a inventores artificiais começa a emergir como uma estratégia económica ao desenvolvimento tecnológico, podendo promover um mercado mais receptivo a novas criações e, portanto, mais competitivo.
De acordo com o Business Insider, este facto representa uma grande vitória para o Artificial Inventor Project (AIP) liderado por Ryan Abbott, da Universidade do Surrey, no Reino Unido. O projeto depositou as primeiras patentes em 2019 e propõe que o ato que qualifica uma pessoa como inventor possa ser automatizado funcionalmente por uma máquina, ou neste caso, uma Inteligência Artifical, representada por DABUS.
O Business Insider relata que mais pedidos de patentes relacionados com estes sistemas foram depositados em pelo menos dez outros países, incluindo Brasil, Índia, China, Japão e Taiwan. África do Sul continua a ser o único país do mundo, até agora, a aceitar que as invenções geradas por IA possam ter um inventor reconhecido no pedido de patente.
No entanto, a decisão da África do Sul não significa que outras jurisdições irão adotar essa posição. Existe ainda um debate sobre a capacidade de sistemas de Inteligência Artificial serem considerados inventores e, caso sejam reconhecidos como tal, sobre como devem ser atribuídos os direitos de propriedade intelectual resultantes destas invenções.
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