Contrafação e Pirataria em tempos de pandemia

Conhecido como um dos problemas mais complexos do séc. XXI, anualmente, no início do mês de junho, comemora-se o Dia Mundial da Anti-Contrafação. Este visa sensibilizar a sociedade para o ilícito da contrafação e da pirataria, designadamente para os danos económicos que provoca, mas também compreender as eficiências das entidades portuguesas de enforcement.

O fenómeno da contrafação e pirataria resulta, em grande medida, na violação de direitos de propriedade industrial e intelectual.

Dada a sofisticação dos meios que utiliza, a contrafação e pirataria passam, muitas vezes, despercebidas aos olhos do consumidor e aos mecanismos de controlo e fiscalização. Tudo indica que este é um fenómeno com tendência a aumentar, conforme se conclui uma análise ao Relatório de Atividades 2021 do Grupo Anti-Contrafação (GAC).

Por uma questão de rigor jurídico, importa salientar que, no referido relatório, os termos “contrafação” e “pirataria” não são utilizados em sentido jurídico, mas na sua forma mais genérica, abrangendo quaisquer crimes, contraordenações ou quaisquer outras infrações a direitos de propriedade industrial (patente, marca, design, etc) e direitos de autor e direitos conexos, incluindo a comercialização em Portugal de um produto com uma marca aqui registada, sem autorização do titular do registo, ainda que o produto seja o “original”. Com efeito, o conceito de contrafação nos dados estatísticos divulgados pelo GAC não corresponde à aceção legal de contrafação previstas no Código de Propriedade Industrial e no Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos, compreendendo quaisquer crimes, contraordenações e outras infrações dos direitos de marca, de patente, de desenho ou modelo (design), ou de outros direitos industriais menos comuns.

 

Estatísticas 2020/2021

O Grupo Anti-Contrafação (GAC) – que engloba a Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica (ASAE), a Autoridade Tributária (AT), a Guarda Nacional Republicana (GNR), o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), a Polícia Judiciária (PJ) e a Polícia de Segurança Pública (PSP) – foi criado em 2010, de forma a fornecer uma resposta concertada entre organismos nacionais no combate à contrafação e pirataria. Realiza, entre outras atividades, relatórios de atividades anuais, publicados, com vista à análise estatística deste tipo de ilícito, bem como a avaliação da performance das entidades portuguesas envolvidas.

De acordo com o relatório de atividades de 2021, em Portugal, as entidades GAC apreenderam um total de 2.941.505 de produtos contrafeitos ou pirateados. Não obstante, com as contingências impostas pela situação pandémica, deparámo-nos com um acréscimo do número de apreensões comparativamente ao ano de 2020, cujo número de produtos contrafeitos ou pirateados apreendidos foi de 1.390.379, o que se traduz num aumento de cerca de 112%.

Ora, estamos perante um aumento significativo em relação a 2020, de cerca de 112%, como se pode observar no gráfico infra.

 

Fonte: Relatório de Atividades 2021 - GAC

 

Em 2021, destacam-se as apreensões de “Outros”, que compreendem peças e partes que constituem e complementam produtos de vestuário, calçado, bem como, as próprias embalagens, rótulos e etiquetas, entre outros. Seguem-se as apreensões de alimentos e bebidas, que representam cerca de 37% das apreensões, logo acompanhadas das apreensões de vestuário, que totalizam 19% das apreensões realizadas.

No que diz respeito à apreensão no sector de alimentos e bebidas, verifica-se que o aumento foi de cerca de 1083%; em relação a “outros” o acréscimo foi de 97% e quanto ao vestuário verificamos que o aumento foi de 54%. Relativamente a outras categorias, houve um decréscimo relevante da apreensão do número de brinquedos, de cerca de 87% e uma diminuição também relevante da apreensão de perfumes e cosméticos, de cerca de 99%. Do relatório resulta que, quanto à origem, a totalidade de mercadorias contrafeitas apreendidas em Portugal pelas autoridades aduaneiras em 2021 provém da República Popular da China.

A atuação das entidades também se tem revelado ativa no que diz respeito a medicamentos. De acordo com o referido relatório, no ano de 2021 foram controladas pela Autoridade Tributária e Aduaneira um total de 6.693 remessas de medicamentos, contendo 924.504 unidades de medicamentos. Os Estados Unidos da América (US), continuam a ser o principal país de proveniência, seguida pela Grã-Bretanha (GB), Índia (IN), República Popular da China (CN) e Brasil (BR).

No ramo dos medicamentos foram apreendidos pela GNR 2.105 medicamentos.

 

Fonte: Relatório de Atividades 2021 - GAC

 

Conclui-se, assim, que prevalece uma tendência crescente da contrafação e pirataria em Portugal, apesar dos esforços relevantes que as autoridades portuguesas têm vindo a desenvolver no seu combate.  Cada vez mais, é importante entender que o problema da contrafação e da pirataria é, além de um problema económico, também social.

De forma a consciencializar a sociedade para estes atos ilícitos e as respetivas consequências, é necessário relevar e demonstrar que a contrafação é prejudicial à economia nacional, causando danos irreversíveis. É premente dissuadir a população de adquirir produtos que possam configurar contrafação e pirataria, sempre que lhes seja possível identificar essas situações.

Para tal, as entidades envolvidas devem, em tudo o que está ao seu alcance, investir em informar o consumidor (seja em lojas físicas ou virtuais), por exemplo, fornecendo métodos que assistam na identificação de um produto contrafeito ou pirateado. Todos os anos, a contrafação contribui para a perda de milhares de empregos, bem como para perda de milhões de euros nas vendas dos produtos originais.

Seja em tempos de pandemia ou pós-pandemia, é de todo crucial que as várias entidades ajam, efetivamente, de forma concertada no combate à contrafação e pirataria, sendo absolutamente essencial que os agentes económicos envolvidos estejam munidos da informação necessária para reagir, rápida e atempadamente, a uma situação de contrafação e pirataria, acionando os mecanismos legais decorrentes dos seus direitos de propriedade intelectual e industrial.

 


Reveja aqui a análise de Joâo Pereira Cabral aos números da contrafação em Portugal, no ano de 2019.


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